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Novos caminhos para a reforma da Lei de Recuperação Judicial
8/01/2021

Novos caminhos para a reforma da Lei de Recuperação Judicial

Pelas mais diversas razões, o ano de 2020 entrará para a história. E no campo da insolvência empresarial não será diferente. A profunda recessão econômica provocada pela pandemia da Covid-19 impôs sérios desafios às empresas e à já fragilizada economia nacional e, mais do que nunca, colocou em evidência a necessidade de uma reforma em nossa legislação. Tal reforma foi recentemente aprovada pelo Congresso Nacional e aguarda sanção presidencial.

Mas o que esperar de uma reforma legislativa no atual cenário? A expectativa é que, mais do que apenas alterar dispositivos legais, haja uma aceleração da evolução cultural do trato da insolvência em nosso país.

Uma das ideias que motivam a reforma é a de ampliação. Ampliar as opções e caminhos disponíveis para que devedores, credores e investidores protejam seus interesses. A prática mostra que, apesar de aparentemente antagônicos, os interesses desses diferentes personagens estão interligados, podendo – e devendo –, sem dúvida alguma, coexistir.

A chave para essa coexistência harmônica encontra-se em outra ideia, a de eficiência. Melhorar a eficiência dos procedimentos e reduzir o grau de litigiosidade é, talvez, a melhor forma de proteger os interesses de todos os envolvidos. Quem ganha é a própria economia nacional, formada pela interação entre credores e devedores e por todos os que se beneficiam ou dependem da existência da empresa – de todas as empresas. Mais do que simplesmente protegê-las, deve-se ter em mente a proteção ao fenômeno empresarial.

Diante desse cenário, o projeto de lei propõe valiosos instrumentos para aumentar a eficiência dos processos, como a possibilidade de substituição das assembleias presenciais por procedimentos virtuais, ou a possibilidade de o juiz encerrar a recuperação judicial assim que o plano for homologado. Menção honrosa também ao estímulo à mediação e conciliação, bem como à correção de algumas distorções que permeiam a legislação tributária. Além disso, cabe ressaltar a tão esperada adoção do modelo Uncitral para processos de insolvência transfronteiriços.

A falência é uma das principais beneficiadas no quesito eficiência. A liquidação célere dos ativos e o retorno do empresário às atividades (fresh start) foram incluídos como objetivos expressos da legislação, inclusive com o estabelecimento de prazo não superior a 180 dias para a venda de todos os ativos – prazo este que hoje pode levar décadas. Houve a previsão também de extinção imediata das obrigações do falido junto com o encerramento da falência, permitindo o retorno rápido do empresário ao empreendedorismo.

O projeto de lei também amplia as opções de investimentos disponíveis, especialmente por meio da criação de regras concretas para a concessão de crédito a empresas em recuperação – os chamados empréstimos DIP – e a previsão da possibilidade de venda da empresa, já com a dívida devidamente reestruturada, para o investidor apto e interessado em prosseguir nas atividades. Destaca-se ainda a previsão de que o adquirente de bens alienados com autorização judicial não responderá por dívidas e contingência da empresa em recuperação – garantia esta atualmente estendida apenas às chamadas unidades produtivas isoladas (UPIs).

No entanto, há alguns pontos de atenção. Os amplos poderes concedidos ao fisco (inclusive o de pedir a falência do devedor), a ampliação na interferência judicial durante as negociações e a possibilidade de imposição de um plano elaborado exclusivamente por credores (visto de forma muito positiva por investidores estrangeiros) representam graves mudanças de paradigma. No entanto, a prática certamente se encarregará de aparar as arestas, assim como fez com a lei original em 2005.

Parte importantíssima de qualquer sistema econômico eficiente é saber lidar com suas próprias falhas e esperamos que a atual reforma da Lei nº 11.101 constitua um passo importante nessa direção.

Fonte: Valor Econômico, Novos caminhos para a reforma da Lei de Recuperação Judicial | Direito e Modernidade