Recentemente a Corte de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI) confirmou a decisão da ANTT de declarar a caducidade do contrato de concessão de trecho da Rodovia BR 153, em precedente bastante controverso para o setor.
A operação do trecho da Rodovia BR-153 compreendido entre as rodovias BR-60 (Anápolis/GO) e a TO-070 (Tocantins/TO) foi concedida à Concessionária pela União, por intermédio da ANTT, em contrato celebrado em 12 de setembro de 2014, com início da operação em 31 de outubro de 2014.
Os investimentos previstos pela concessionária eram de 4,31 bilhões de reais. Contudo, em razão de uma série de intercorrências, entre as quais bloqueios de bens determinados pela Justiça Federal, a concessionária enfrentou dificuldades na obtenção de financiamentos, notadamente do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES). Por isso, não teve condições de realizar os investimentos previstos em contrato. No último relatório de acompanhamento disponibilizado pela ANTT, datado de julho de 2016, ficou consignado que “A fim de preservar a utilização dos usuários no mês de Julho a concessionária manteve a operação tapa buraco contida no Plano de segurança Rodoviário. Os demais serviços previstos no mês de Julho estão paralisados aguardando pedido de prorrogação contratual / liberação de empréstimo ponte pelo BNDES. (sic)”, cenário este que persistia há muito tempo.
Em vista disso, foi instaurado procedimento administrativo para apuração dos descumprimentos contratuais da concessionária, que resultou na Deliberação ANTT nº 138 de 23 de junho de 2017, publicada em 26 de junho de 2017. Por meio deste ato normativo, a ANTT reconheceu a ocorrência de inadimplências por parte da concessionária que considerou graves o suficiente para justificar a decretação da caducidade da concessão. As circunstâncias que conduziram a essa situação não foram consideradas. Assim, recomendou ao Presidente da República a decretação da caducidade da concessão, nos termos do art. 38 da Lei Federal nº 8.987/1995 (Lei das Concessões). Por meio de Decreto publicado em 16 de agosto de 2017, o Presidente Michel Temer acatou a recomendação da ANTT e decretou a caducidade da concessão do trecho da BR-153, por inexecução contratual.
Inconformada com a decisão, a concessionária instaurou procedimento arbitral, nos termos da cláusula 37 Contrato de Concessão, alegando que as dificuldades encontradas na execução da avença teriam decorrido exclusivamente da não obtenção do financiamento junto ao BNDES, que seria esperado pela concessionária em razão da ampla divulgação dada pela União à época da publicação do edital de licitação.
A União e a ANTT, por outro lado, argumentaram que o risco quanto à não obtenção do financiamento foi contratualmente assumido apenas pela concessionária, na medida em que inexistia promessa de liberação de empréstimos, por parte do BNDES ou de outro ente público, no Contrato de Concessão, no Edital de Licitação ou em qualquer outro documento. Assim não foram reconhecidas novamente as circunstâncias que alteraram a política de financiamento do BNDES.
Ao analisar os argumentos, a Corte de Arbitragem da Câmara de Comércio Internacional (CCI) reconheceu a caracterização de inadimplência contratual passível penalização por caducidade – a mais grave das penalidades previstas na Lei das Concessões. Confirmou, assim, a perda da concessão por parte da Concessionária. Por consequência, o trecho da Rodovia BR-153 que foi objeto da concessão voltará a ser administrado pela União. Adicionalmente, a sentença arbitral determinou que caberá à União indenizar a concessionária pelos investimentos realizados e não amortizados, descontadas eventuais penalidades, conforme §5º do art. 38 da Lei das Concessões.
A possibilidade de resolução de conflitos envolvendo a Administração Pública pela via da arbitragem foi expressamente prevista pela Lei 13.129/2015, que alterou o art. 1º da Lei de Arbitragem (Lei 9.307/1996). No âmbito da ANTT, a utilização da arbitragem foi regulamentada pela Resolução nº 5.845, de 14 de maio de 2019, que fixou as regras para os processos de solução extrajudicial de controvérsias entre a agência e seus regulados.